O espasmo hemifacial é um distúrbio do movimento relacionado ao sétimo nervo craniano, ou seja, aos músculos inervados pelo nervo facial. Nessa condição, ocorrem contrações tônicas ou clônicas de músculos da expressão facial. Na grande maioria das vezes, o quadro é unilateral, se inicia pela musculatura periorbitária, e passa a incluir posteriormente a musculatura perioral e o platisma.
Apesar de ser considerada uma doença benigna, frequentemente leva a constrangimento e a afastamento do paciente de atividades sociais.
Curiosidade histórica
Foi descrito por Babinski, um dos pais da neurologia francesa e mundial, o "outro sinal de Babinski", caracterizado por elevação da sobrancelha durante o fechamento ocular forçado, denotando contração do músculo frontalis de maneira concomitante ao orbicular do olho no espasmo hemifacial.
Epidemiologia
Estima-se uma prevalência de 11 a cada 100 mil pessoas, e que seja duas vezes mais frequente em mulheres. É habitual a ocorrência na quinta a sexta década de vida.
Fisiopatologia
A causa mais comumente relatada na literatura médica é a ocorrência compressão do nervo facial, na sua zona de saída, por um vaso tortuoso ou ectásico, com consequente desmielinização focal.
Etiologias
O espasmo hemifacial causado por compressão do facial na sua via de saída é chamado de primário, sendo o conflito vascular por uma ectasia na artéria cerebelar superior ou artéria cerebelar anterior inferior. São causas secundárias: tumores do ângulo cerebelo-pontino (como schwannoma do VIII ou meningioma), cisto epidermólise, aracnóide ou lipoma, malformações arteriovenosas, lesões de tronco encefálico, infecções (otite média, meningite basilar por tuberculose), malformações estruturais da fossa posterior (malformações de Chiari, doença de Paget), tumores de parótida e paralisia de Bell.
Quadro clínico
- Início das contrações ao redor do músculo orbicular do olho (90%);
- o "outro sinal de Babinski" (elevação da sombrancelha com a contração do músculo fronalis ipsilateral ao espasmo;
- agrupamento de contrações seguida de espasmo pouco mais prolongado;
- espalhamento gradual para o andar inferior da face (músculos periorais e platisma);
- os movimentos podem ser desencadeados por uma contração sustentada da face seguida por relaxamento;
- persistência das contrações durante o sono;
- sincinesias podem estar presentes durante a fala ou mastigação, principalmente em causas secundárias;
- gatilhos frequentes: leitura, estresse, falar e eventualmente comer;
Diagnóstico e diagnóstico diferencial
O diagnóstico é essencialmente clínico. ENMG pode mostrar sinais de desnervação do nervo facial; RM de encéfalo com sequências CISS/FIESTA pode ser útil em eventual planejamento cirúrgico, na identificação do fator compressivo.
O diagnóstico diferencial deve ser feito com outras condições que levam a hipercontralidade muscular na face: blefaroespasmo, discinesia tardia, tiques motores, espasmo hemifacial psicogênico, crises epilépticas focais envolvendo a face (epilepsia partialis continua), regeneração aberrante após lesão do nervo facial (sincinesias faciais).
Eletrofisiologia
São caracterizados por trens de contração paroxística compostos por descargas de unidade motoras de alta frequência (até 300Hz).
Pode ser encontrado o espalhamento do blink reflex a outros músculos que não somente o orbicular do olho (espalhamento lateral do impulso antidrômico) entre fibras vizinhas no nervo facial, por meio de transmissão efática (interação efática).
Tratamento
Algumas medicações já foram relatadas, com benefícios modestos: carbamazepina, clonazepam, gabapentina, baclofeno, anticolinérgicos.
A terapia com injeções intramusculares de toxina botulínica é a principal terapia utilizada para esta condição. Detalhes sobre a farmacologia da toxina botulínica podem ser vistos em outro post deste blog.
A toxina deve ser diluída a uma concentração mínima, para evitar sua difusão para músculos adjacentes.
São músculos frequentemente injetados: orbicular do olho, procerus, platisma, orbicular da boca, depressor do ângulo da boca. O efeito terapêutico já é visto cerca de 5 dias após a aplicação e dura cerca de 3 meses. Em geral, as sessões de aplicação são marcadas em um intervalo de 3 a 4 meses.
Limitantes do tratamento: custo, necessidade de injeções repetitivas.
Tratamento cirúrgico
Com o advento da terapia com toxina botulínica, houve uma busca cada vez menor pelo tratamento cirúrgico. O procedimento cirúrgico de escolha é a descompressão microvascular do nervo facial. A principal limitação são os riscos inerentes ao procedimento cirúrgico e à anestesia geral. No entanto, é única alternativa de tratamento curativo. Tende a ser reservada para pacientes que não responderam de modo satisfatório à toxina botulínica.
Referências
Chaudhry N, Srivastava A, Joshi L. Hemifacial spasm: The past, present and future. J Neurol Sci. 2015;356(1-2):27-31.
Abbruzzese G, Berardelli A, Defazio G. Hemifacial spasm. Handb Clin Neurol. 2011;100:675-80.


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